Todo mundo conhece o acróstico TULIP, mas nem todos sabem de onde vem essa sigla. Os Cânones de Dordt estão entre os mais famosos, mas não lidos, veredito de qualquer Sínodo Reformado. Os cânones são mais de cinco letras. Os cânones ensinam uma doutrina pastoral da graça e fornecem um modelo para a mordomia do Evangelho.
Os cânones (regras) do Sínodo de Dordt foram escritos após anos de controvérsia dentro das igrejas reformadas na Europa e na Grã-Bretanha. No final do século XVI, as doutrinas reformadas do pecado, graça, fé, justificação, expiação, perseverança e segurança enfrentavam uma resistência crescente. Ao mesmo tempo, James Hermanson (c. 1559–1609), conhecido por nós como Jacob Arminius, era um estudante na Academia de Genebra, onde se mostrou promissor e sem evidências óbvias de heterodoxia.
Perguntas sobre da doutrina de Arminius surgiram em 1590, mas Jacob havia contraído um bom casamento e seus padrinhos o protegeram. Aproximadamente em 1594 ele desenvolveu uma nova leitura de Romanos 7, na qual ele argumentou que Paulo não poderia estar descrevendo uma pessoa regenerada. Em 1596, depois de estudar o capítulo 9 de Romanos, ele concluiu que a inclusão no pacto da graça não é determinada unicamente pelo decreto soberano de Deus. Em vez disso, Deus quis aceitar aqueles que buscam aceitação com Ele pela fé. Este foi uma hábil alteração. Ele parecia estar defendendo a justificação pela fé ao mesmo tempo em que redefinia a doutrina da eleição e da fé. Com o passar do tempo, suas visões se tornaram mais conhecidas. Pastores confessionais e teólogos na Holanda e em outros lugares começaram a soar o alarme. Diálogos foram realizados e Arminius disse as coisas certas, deixando os ortodoxos inquietos, mas sem provas concretas de erro. Apesar das dúvidas, os regentes da Universidade de Leiden indicaram Arminius para ser o professor de teologia. Quase imediatamente, Arminius entrou em controvérsia. Ele foi denunciado que ensinava que Deus elege aqueles a quem ele sabe que iriam crer. Ele também levantou questões sobre a doutrina reformada do pacto das obras. Em público, no entanto, Arminius fez de tudo para concordar com seus colegas ortodoxos.
Em 1605, no entanto, os pastores reformados confessionais pediam disciplina contra Arminius e seu crescente grupo de seguidores (os arminianos). Os ortodoxos pediram um sínodo nacional para disciplinar os arminianos, mas os políticos recusaram. Em vez disso, os líderes arminianos no governo pediram um sínodo para revisar a Confissão Belga e o Catecismo de Heidelberg, a fim de torná-los mais receptivos às opiniões de Arminius.
Arminius morreu em outubro de 1609, e a controvérsia entrou em uma nova fase. Os arminianos publicaram um protesto contra as igrejas reformadas em que delinearam cinco objeções à doutrina reformada. Algumas respostas preliminares foram elaboradas em 1611, mas foram os remonstrantes que primeiro nos deram cinco pontos aos quais as igrejas Reformadas responderiam no grande Sínodo de Dort.
O Sínodo de Dort quase não ocorreu. Forças políticas dentro do governo trabalharam poderosamente para impedir que um sínodo nacional resolvesse o problema. A crise teológica ameaçou irromper numa guerra civil. O príncipe Maurício de Nassau (1567 a 1625), que simpatizava com os ortodoxos, pediu um sínodo nacional. Os remonstrantes reagiram organizando tumultos em 1617. O principal rival de Maurício ameaçou com guerra, mas quando Maurício chegou a Utrecht (uma fortaleza arminiana) em 1618 com veteranos experimentados em batalhas. Então, a oposição se findou.
O maior Sínodo Reformado Internacional reuniu-se em Dordrecht, em 13 de Novembro de 1618. Estiveram presentes delegações de toda a Europa e da Grã-Bretanha. Proibido por Louis XIII de participar, a delegação francesa estava, de modo notável, ausente.
Em 1610 os remonstrantes propuseram estes cinco pontos: Um: Eleição condicionada à fé e obediência previstas; Dois: Expiação Universal; Três: A regeneração permite que os pecadores façam o bem para a salvação; Quatro: graça resiste; Cinco: os crentes podem cair.
Como o sínodo respondeu aos Cinco Artigos dos remonstrantes, ponto por ponto, a ordem dos Cânones não é realmente TULIP. O primeiro princípio da doutrina dizia respeito à eleição e reprovação divinas. Com o apóstolo Paulo, Agostinho, Lutero e Calvino, o sínodo determinou que, em virtude da queda de Adão, somos tão profundamente pecadores que merecemos apenas condenação e somos incapazes de fazer algo para nos prepararmos para a graça ou mesmo cooperar com a nossa justificação (1.1). O instrumento da justificação é uma fé que recebe somente a Cristo para a salvação (1.2–4). Somente os eleitos chegam à fé (1, 5–6). A eleição em Cristo é a escolha imutável e eterna de Deus de um certo número de pessoas para a salvação não condicionada por qualquer coisa no pecador (1.7-11). Os crentes encontram conforto nesta verdade, pois somente os eleitos acreditam, e sua fé é evidência da graça de Deus para com eles. Os eleitos, de diferentes maneiras, alcançarão a certeza da graça de Deus para com eles, “não por curiosos buscarem as coisas secretas e profundas de Deus”, mas crendo no evangelho e prestando atenção aos “frutos infalíveis da eleição” (1.12). Aqueles que duvidam devem “fazer uso dos meios que Deus designou para operar essas graças em nós” (1.16).
O segundo princípio da doutrina ensina que a morte de Cristo não tornou simplesmente a salvação disponível para aqueles que desejam, pelo contrário, o nosso Salvador realmente garantiu a salvação de todo o Seu povo. A Sua morte satisfez a justiça de Deus para todos os eleitos (2.1-2). A morte de Cristo é de valor infinito, mas destinada a satisfazer a ira de Deus para os eleitos. Portanto, a promessa do Evangelho é que “todo aquele que crer em Cristo crucificado não pereça, mas tenha a vida eterna” (2.5). Ao contrário da caricatura do Calvinismo, o sínodo disse que, por Sua morte, Cristo redimiu “de todos os povos, tribos, nações e línguas, todos aqueles e somente aqueles que foram eternamente escolhidos para a salvação e dados a Ele Pai” (2.8).
O terceiro e quarto princípio da doutrina foram combinados para articular a doutrina reformada do pecado e da regeneração. Embora fôssemos criados bons e corretos, escolhemos livremente o pecado e com ele a morte (3/4.1). Somos tão corruptos por natureza que somos incapazes de viver ou escolher livremente à parte da “graça regeneradora do Espírito Santo” (3/4.3). O conhecimento natural e a lei de Deus apenas nos condenam (3/4.4-5). Somente Deus o Espírito “através da palavra ou ministério de reconciliação” eleva seus eleitos à vida (3/4.6). Cremos porque Deus nos fez vivos (e não o contrário), mas o Espírito nos faz vivos operando através da administração da Palavra; a proclamação externa do Evangelho é sincera e a promessa do Evangelho é sincera (3/4.8, 11, 17). Aqueles que recusam o Evangelho são responsáveis por suas escolhas, e a regeneração dos eleitos deve ser creditada somente à graça soberana de Deus (3/4.10, 12). A soberania de Deus não nos torna “fantoches e blocos” porque o Espírito opera através da Palavra. Ele “acelera espiritualmente, cura, corrige e, ao mesmo tempo, dobra-o doce e poderosamente, onde antes prevalecia a rebelião e a resistência carnais” (3/4.16).
O quinto princípio defendia a perseverança dos santos. Aqueles a quem Ele dá o dom da fé, a quem Ele “regenera pelo Espírito Santo, ele também liberta do domínio e escravidão do pecado” (5.1). A nossa luta contínua contra o pecado dando-nos motivos para nos humilharmos e buscarmos o paraíso (5.2). Deixados a nós mesmos, cairíamos, mas a graça “misericordiosamente confirma e poderosamente nos preserva até o fim” (5.3). Algumas vezes os crentes, como Davi, caem em pecados graves e perdem o senso do favor de Deus, mas Deus os preserva (5.4-5). Deus nunca permite que Seu povo “prossiga até perder a graça da adoção” (5.6). Cristo “renova certa e eficazmente” o seu povo “para o arrependimento, para uma tristeza sincera e piedosa pelos seus pecados” (5.7). O Espírito não garante a seu povo, contudo, “por qualquer revelação peculiar”, mas sim “brota da fé nas promessas de Deus” (5.10). A garantia da graça não produz imoralidade entre os cristãos. Antes, “torna-os muito mais cuidadosos e preocupados em continuar nos caminhos do Senhor” (5.13). Quando o Espírito nos torna vivos através da pregação do Evangelho, Ele fortalece a nossa fé e certeza através dos sacramentos (5.14).
Os Cânones de Dordt representam um notável consenso de convicção entre as igrejas reformadas sobre doutrinas essenciais. De fato, a própria Reforma estava em jogo. Se o favor de Deus é condicionado a qualquer coisa em nós, então estamos perdidos, porque estamos mortos em pecado. Se o Evangelho é reconfigurado para incluir a nossa obediência, então não é mais o Evangelho. Se a expiação é meramente hipotética, se os eleitos podem cair, então a graça não é mais graça.
A resposta do Sínodo de Dordt foi cuidadosa, pastoral e firme. O Sínodo concluiu que não ajuda a piedade ou a segurança fazer com que a nossa salvação dependa de qualquer coisa em nós. O evangelho é Cristo para nós. Os Cânones de Dordt são uma herança a ser valorizada, mas também devem ser usados em nossas congregações, em nossas aulas de catecismo e como um exemplo de como responder aos desafios.
Acessado em The Canons of Dordt.
Traduzido por Ewerton B. Tokashiki
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